Indefinição nacional sobre federação tensiona disputa no RS
Beto Albuquerque (a esquerda)
e Edegar Pretto (a direita) são pré-candidatos ao Piratini pelo PSB e PT,
respectivamente | Foto: Gustavo Lima / Câmara dos Deputados / CP e Roger da
Rosa / MTE / ALRS/ CP
O debate sobre a formação de
uma federação partidária que funcione como cimento para a pré-candidatura do PT
à corrida presidencial já causa impacto direto nas articulações de partidos de
esquerda e centro-esquerda no RS. Lideranças locais de siglas como PT, PSB e
PCdoB divergem sobre a necessidade e os objetivos de uma grande federação que
tenha o PT como participante. A federação partidária é uma novidade da eleição
de 2022, aprovada pelo Congresso no ano passado, e originalmente idealizada
como alternativa para salvar partidos ameaçados de extinção por não alcançarem
a cláusula de barreira. Entre eles, PCdoB, Cidadania, Novo, Solidariedade,
Podemos, PSol, Pros, Avante, Rede e PV.
Desde que prosperaram as
tratativas para a indicação do ex-governador Geraldo Alckmin como vice de Lula,
contudo, a possibilidade de formar federações partidárias ganhou novos
contornos. Ao plano inicial de unir siglas pequenas ou pequenas e médias,
garantindo sua sobrevivência, foi adicionado o das negociações entre PT e PSB
para que o ex-tucano Alckmin se filie ao PSB e garanta a vaga do partido na
chapa presidencial.
Uma federação, argumenta parte
dos negociadores petistas, daria mais segurança a um eventual futuro governo
porque, nela, as siglas participantes precisam ficar juntas e funcionar como um
partido único por pelo menos quatro anos. É diferente de uma coligação, na qual
os partidos podem se unir para a eleição e, depois, em caso de vitória, a
qualquer tempo se separarem.
Além de "amarrar" as
legendas por todo o período de governo, a federação poderia, para além de
garantir grandes bancadas ao bloco de centro-esquerda, mais especificamente
aumentar bancadas petistas. A formação de grandes bancadas no Senado e na
Câmara, a garantia de continuidade no comando em estados onde o PT já governa e
a indicação de Fernando Haddad para a disputa pelo governo de São Paulo são
elencadas como prioridades.
Neste contexto, é público que
o PT concorda em que o PSB fique com a cabeça de chapa no Rio de Janeiro, em
Pernambuco e no Espírito Santo. E, há semanas, são ventiladas informações de
que estaria disposto a abrir mão das candidaturas no Rio Grande do Sul e no
Acre em favor dos socialistas. Mas, na semana passada, ao se referir ao RS, o
ex-presidente Lula sugeriu que a definição sobre se o candidato será do PT ou
do PSB se baseie em pesquisas que apontem qual dos postulantes se sai melhor.
Petistas gaúchos repetem
estratégia de ganhar tempo, mas socialistas têm pressa
No RS, o PSB lançou o
ex-deputado Beto Albuquerque ao governo e, o PT, o deputado estadual Edegar
Pretto. Ambas as siglas garantem que manterão as candidaturas, mas sabem que
dependem da negociação nacional. As declarações de Lula não acalmaram os ânimos
porque, conforme lideranças petistas e socialistas, “há pesquisas para todos os
gostos”.
Além disto, como as federações
são nacionais, obrigando legendas que formam o bloco no país a replicá-lo
regionalmente, a demora das direções nacionais em chegar a um consenso e a
divulgação, após reunião na quinta-feira, de que vão solicitar ao Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) a prorrogação, de março para junho, do prazo para
decidirem sobre a formação ou não da federação, aumentaram a tensão em solo
gaúcho.
O secretário-geral do PT no
RS, Carlos Pestana, que já é apresentado como um dos coordenadores da campanha
de Pretto, repete a estratégia adotada nacionalmente, no sentido de estender as
discussões e contornar embates públicos. “A federação é positiva, porque constrói
relações políticas mais programáticas e, para o PT, interessa porque
potencializa votos. Mas é um debate muito complexo, que inclui um conjunto de
temas. Por isso, vai se estender.”
Mesmo com o comando de Lula,
dentro do PT (parte de gaúchos incluídos), não há consenso sobre integrar uma
federação. Uma parcela dos deputados e candidatos a executivos e legislativos
em 2022 aposta que a candidatura presidencial vai alavancar de tal forma o voto
que eles se elegerão sem precisar investir nesse tipo de união.
No Estado, enquanto o PT
repete a tática nacional de ganhar tempo, PSB e PCdoB querem ‘bater o martelo’.
Beto Albuquerque diz que devem ser mantidos os objetivos iniciais, e critica o
rumo das negociações. “As federações foram criadas para ajudar partidos que têm
história a não morrer. Elas devem ser feitas onde há necessidade. Mas, para
alguns partidos, viraram zona de conforto: mesmo não precisando, passaram a
insistir em fazer. Não podemos deformar um instrumento recém-criado. O PSB e o
PT não dependem de federação para estarem juntos, podem se coligar”, argumenta
o pré-candidato.
Beto defende que o PSB forme
uma federação com o PCdoB e, se possível, com o PV, e declara que o debate
sobre a união com o PT neste formato está atrasando demais as decisões tanto
nos estados como a nível nacional. No RS, uma federação que tenha o PT, em
função da configuração local do partido, também freia a busca de apoios, mesmo
que informais, que Beto garimpa junto a siglas e lideranças de centro-direita.
Já o PCdoB local aposta que o partido vai definir seu rumo em fevereiro,
durante a reunião da direção nacional.
Roso diz que não é momento de
"bater pé"
A direção nacional do PCdoB é
a favor de federar com o PT. Mas, nos bastidores, no RS, tanto integrantes do
PSB como do PCdoB receiam que, em uma federação, o PT acabe por repetir
práticas do passado, como tratar os dois aliados como apêndices. Ou, então, que
acabe por ‘engolir’ os parceiros. Dão como exemplo a participação da
ex-deputada Manuela D’Ávila na eleição. Na avaliação dessas lideranças, caso
Manuela concorra a uma cadeira no Legislativo, seja na Câmara Federal ou na
Assembleia Legislativa, são muito maiores as chances de “puxar” outro candidato
do próprio partido caso o PCdoB esteja federado apenas com o PSB ou, também,
com o PV, do que se o PT estiver no bloco. Com a participação do PT, ao
contrário, aumentariam as chances de ela ajudar a eleger um petista, visto que,
em tese, o PT teria maior quantidade de candidatos com melhor desempenho do que
o PCdoB, o PSB e o PV.
Questionado sobre as
divergências, o presidente estadual do PCdoB, Juliano Roso, tenta acalmar os
ânimos. “Temos, os três, nomes para compor a chapa majoritária. Então devemos
sentar e construir um consenso. Dá para contemplar todo mundo. O que não
podemos fazer agora, sob qualquer hipótese, é impor uma candidatura ou bater
pé”, resume. Ele assinala que o PCdoB também já se adiantou e apresentou uma
proposta inicial de estatuto de uma federação, composta por cinco pontos,
estando ou não o PT nela.
O primeiro ponto prevê que 50%
da direção da federação seja composta igualitariamente entre as legendas
participantes. O ponto dois, que os outros 50% sejam estabelecidos a partir dos
votos a deputado federal que as siglas obtiveram em 2018. O terceiro item é de
que não tenha um presidente, e sim um colegiado integrado pelos dirigentes dos
partidos. Por fim, a proposta prevê que o que for consenso entre os partidos
entre no estatuto da federação; e que o programa comum contemple
obrigatoriamente todas as legendas participantes.
Por: Flávia Bemfica Correio do
Povo